quarta-feira, 23 de novembro de 2011

O MELHOR E O PIOR DOS MUNDOS

Pr. Ronan Boechat de Amorim


"Era o melhor dos tempos, era o pior dos tempos." A frase é o início do romance "Uma História de Duas Cidades",  de Charles Dickens, que fala a época imediata à Revolução Francesa, com tantas novidades e liberdades, mas também com abusos, medo e um certo caos: era a idade da sabedoria, a idade da tolice; a época da fé, a da incredulidade; a estação da luz, a das trevas; a primavera da esperança, o inverno do desespero; diante de nós, tínhamos tudo e nada; estávamos indo direto para o céu e na direção oposta.

Como acontece hoje, vivemos também no pior e no melhor dos mundos. A frase, portanto, continua muito atual e serve perfeitamente para falar de nosso mundo, de nossa época.

Se por um lado temos a preocupação com o meio ambiente, justiça social, fim da pobreza, cidadania para todos, democracia, emancipação feminina, inclusão das pessoas portadoras de deficiência,  o resgate dos direitos da pessoa idosa, liberdade religiosa, democratização da informação, direitos do consumidor, avanços tecnológicos fantásticos, por outro, infelizmente, temos a corrupção generalizada,  a impunidade, o culto da aparência, a falta de limites, o fundamentalismo religioso, o terrorismo, as guerras, o aumento significativo da diferença entre os mais ricos e os mais pobres, um cristianismo cada vez mais dividido e superficial, a velocidade enorme em que as mudanças estão acontecendo, etc... Depois de séculos de orientação e repressão do Cristianismo, o mundo experimenta uma liberdade sem precedentes em relação ao cristianismo, mas infelizmente uma liberdade sem limites. Nosso tempo é marcado pela liberdade, mas igualmente pela falta de limites.

A Igreja cristã que mandou e abusou no mundo por séculos após a surpreendente aliança em 320 a.C. com Constantino, o imperador romano, nunca teve tão pouca autoridade e prestígio. Depois de 20 séculos de primazia, o cristianismo vai se tornando cada vez mais apenas uma opção religiosa. Seja pelos equívocos que cometeu quando esteve aliada aos impérios e reinos, seja pelo desgaste natural, seja pela sua fragmentação em milhares de grupos concorrentes e beligerantes, seja por ser o nosso tempo um tempo que gosta de transgredir as tradições e valores estabelecidos e por ser o modismo um valor moderno.

Diante da modernidade algumas igrejas preferem trancar em si mesmas para não se contaminarem e são belos fósseis do século XVI em pleno século XXI. Outras, atabalhoadamente, para não perder público e renda, vai adequando meio e mensagem à exigência light e soft da modernidade. Para garantir público abre mão de conteúdos fundamentais do evangelho para agradar ao seu público, pois, na lei de mercado, o cliente tem sempre razão. Como não dá mais ibope, não se fala mais de pecado e santificação. O que atrai público é descarrego quando as coisas não andam bem, e confiança nos benefícios imediatos e garantidos de uma fé pragmática num Deus que se aceita ordens de fiéis que fizeram corrente para mover o coração de Deus e que compraram algum tipo de amuleto “bíblico” como pedaços de pedra do muro das lamentações em Jerusalém ou água do poço de Jacó.

Certamente precisamos olhar para Jesus, nosso exemplo em tudo, e aprender com ele. Inclusive na sua prática de evangelização. Pois só assim, por mais incrível que possa parecer, é que poderemos nos tornar uma igreja viva, bíblica e contemporânea, com uma mensagem bíblica e compreensível ao homem e mulher modernos, sem capitular diante dos valores da sociedade moderna.

Tal como no tempo de Jesus e da igreja primitiva e perseguida (antes, portanto, da aliança com Constantino), o Evangelho precisa ser anunciado hoje num mundo pagão, violento, plural, não por força de lei e ameaças, mas pela coerência e testemunho pessoal do cristão e pelo poder do Espírito Santo. Hoje, “os impérios e reinos desse mundo”, romperam a aliança com a igreja e voltaram a promover o paganismo, a idolatria e as leis de mercado. E o mundo perdeu o medo da igreja e a igreja perdeu o controle político e cultural que tinha sobre povos e nações. Vivemos num mundo que a seu modo crê em Deus, mas que olha com desconfiança e indiferença pra igreja.

A mensagem de Deus precisa ser comunicada. Não apenas com palavras, pois ela não é uma filosofia ou uma teoria. E para ser anunciada e comunicada precisa ser vivida e testemunhada (partilhada) por quem foi alcançado pelo amor de Deus. Só amando e servindo conseguimos repartir o amor de Deus. Ao evangelizar e discipular eu não quero apenas que o outro saiba o que eu sei, eu quero que ele viva uma nova vida como eu vivo em Jesus.

Jesus, Paulo, Pedro, Barnabé, Lídia, Priscila, Timóteo, Apolo, etc..., têm muito a nos ensinar sobre vida cristã e sobre evangelização para os nossos dias, afinal viveram e foram grandes evangelistas em épocas conturbadas. Embora o mundo e as pessoas hoje sejam completamente direfentes das pessoas do tempo de Jesus e daqueles primeiros cristãos, o Evangelho é o mesmo e Jesus é o mesmo. As técnicas de evangelização podem até mudar, o conteúdo do Evangelho jamais mudará. O Evangelho não é antigo nem moderno, ele é de todos os tempos, ele é eterno. É a resposta certa para o melhor e o pior dos mundos.

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